Gosto de me comparar a um barco, um navio que viaja pelo oceano da vida. Visitando vários lugares, conhecendo muitas pessoas e entendendo as culturas. Agora estou no porto, atracado, descansando das jornadas. O casco já mostra sinais de desgaste, a pintura enferrujada revela a avançada idade.
De um de meus olhos sai uma lágrima que mais parece uma corrente com uma âncora. Fruto de uma tristeza que me abala de vez em quando. Vindo de não sei onde, de vidas passadas, de atitudes não pensadas ou pensadas demais e sentidas de menos... Uma lágrima que cai no oceano de lágrimas e permanece no fundo, como a âncora, aguardando uma ação.
Mesmo ancorado permaneço mergulhado na água, sentindo a vida fluir ao meu redor. Sempre há um lado iluminado pelo sol. Um lado que demonstro às pessoas. E sempre há um lado obscuro pela sombra, lá estão meus segredos. Mas será que é só quando navego pelo mundo que esses dois lados se mostram livres?
Só quando as águas se tornam agitadas, o caminho desconhecido é que estou inteiro? Só quando não há portos seguros a vista eu me mostro por inteiro para ficar mais forte?
Não, as aparências enganam. É quando estou atracado, tranquilo é que posso descansar a minha mente. Fazer uma faxina interna, limpar e pintar o casco. Não preciso nem de ancora para me estabilizar. Posso viajar livremente com minha mente, sem medo de afundar. Posso deitar e olhar as estrela sem medo das tempestades repentinas. Posso relaxar, fechar os olhos e me orgulhar das ferrugens no caco que tantas viagens marcaram, e que no final das contas, possuem sua beleza própria.